Aquaman e a mudança repentina da DC nas mãos de James Wan

Maysa Costa
10 min readDec 24, 2018

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Sem spoilers

Jason Momoa como Aquaman (2018)

Arthur Curry descobre que seu irmão quer travar uma guerra com as pessoas da superfície, para impedi-lo ele precisa encontrar um tridente mitológico do rei Atlan para revogar o reino de Atlântida. Com direção de James Wan (diretor de invocação do mal 1 e 2 e Jogos Mortais), “Aquaman” tem fortes cenas de ação (bonitas e bem coreografadas)e possui uma direção precisa, há cenas nas quais um personagem derruba outro e a câmera acompanha o movimento de maneira fluida. O uso de câmera lenta é pontuado e aparece em cenas ação deixando-as mais intensas e a transição entre passado e presente é muito orgânica, com uso de cortes que se harmonizam e alavancam a narrativa. Wan equilibra pontos da narrativa de maneira que ela e o tom do filme não fiquem completamente desconexos.

Os fisherman em “Aquaman” (2018)

O CGI se justifica e é bem feito (exceto por alguns bonecos digitais que substituem atores em alguns momentos), a criação de mundo é um espetáculo a parte, a luminosidade de uma Atlântida antiga, mas muito tecnológica e a organização dessa sociedade. Temos que parabenizar a direção de arte pelo belíssimo trabalho. Além de tudo, os efeitos dentro da água são incríveis, podem não ser realísticos, mas abraçam a inspiração nos quadrinhos proposta pelo filme, os cabelos e roupas que se movimentam com a maré, as lutas dentro da água na qual fazem o efeito de quando algo é balançado rápido debaixo d’água (detalhes sutis como esse que mostram o cuidado do diretor, da direção de arte e efeitos especiais do filme). Não se pode também esquecer de parabenizar os cuidadores do efeito sonoro, é lindo de ver o carinho e o detalhismo deles. Desde como soa o barulho da câmera ao estar filmando a superfície e de repente entrar dentro do mar (dá pra escutar o barulho “pluff” ) até as cenas de ação e as conversas debaixo d’água que há uma sonoridade própria (claramente fizeram um estudo intensivo e pensaram como seria uma interação dentro do mar).

Os diálogos do filme que muitas vezes são bregas e afetados, acabam funcionando por causa do elenco e do compromisso do diretor e seu filme com o tom da narrativa. Entendam, há uma diferença de um filme ser brega e se reconhecer assim e levar a narrativa em um tom descontraído e um filme ser brega, mas querer carregar o sério. A DC é muito conhecida pelo tom sério de seus filmes, entretanto, James Wan se liberta das amarras que Nolan construiu com a trilogia do Batman e traz um personagem, que convenhamos, não vamos admirá-lo por sua inteligência ou habilidades interpretativas, mas pela força bruta e seu timing cômico.

Cavalos marinhos de Atlântida

“Aquaman” tem muitos atributos, mas o roteiro não é um deles, é cheio de facilitações narrativas, pieguice e parece se preocupar em levar o filme de A até B, ignorando o percurso até lá. Sem dúvida o que mais incomoda é o excesso de exposição, os personagens estão constantemente dizendo o que vão fazer ou o porquê daquilo acontecer, se não é um para o outro diretamente é utilizando frases de efeito que são igualmente expositivas. Todavia, isso seria um problema maior se o filme não estivesse sobre as rédeas de James Wan que usa recursos de som e filmagem para disfarçar, por exemplo, algumas cenas tem um som de uma guitarra levinha trazendo um tom lúdico, já outra, o filme fica um tom mais “comédia romântica” e o Wan abraça o clichê brega desse gênero com trilha sonora estilo de filmagem específicos desses filmes (acredite, quando vocês assistirem saberão de que cena estou falando).

Amber Heard e Jason Momoa em “Aquaman” (2018)

Em relação aos atores, Amber Heard nos dá uma Mera cheia de atitudes, inteligente, irônica e determinada, além de ter uma ótima química com o Jason Momoa. Em falar no Momoa ele está completamente a vontade no papel, dá pra perceber o quanto ele está confortável fazendo o Arthur Curry. Na verdade, parece que simplesmente falaram “Olha Jason, seja você mesmo” e filmaram isso. Infelizmente não se pode tecer os mesmos elogios para o Patrick Wilson (Orm) e o Yahya Abdul-Mateen II (Arraia negra — sim eu procurei o nome dele no Google porque não sei escrever rs), eles são operantes como vilões chegando ao objetivo maior que é causar ameaça. Entretanto, são bastantes unilaterais, Patrick proporciona um rei Orm sem muita ousadia que foi desfavorecido pelo roteiro (acredito que James Wan deveria escolher um ator que tivesse jogo de cintura para lidar com o roteiro que nem ele mesmo o fez).

Arraia Negra nos novos 52 (HQ) e Arraia Negra no filme “Aquaman” (2018)

Já o Yahya repete zilhões de vezes que está em busca de vingança e desmerece o arraia negra ao nos entregar um vilão que mais faz careta que tudo. Mesmo tendo como pano de fundo certas motivações ambientais e relações familiares dos vilões, o filme fica apenas na superfície ao tratar desses assuntos, ele passeia na temática, mas sem se aprofundar demais (pode ter sido por causa do tempo de filme, mas foi realmente uma pena, pois achei que seria muito interessante desenvolver essas motivações desses vilões). Nicole Kidman está no filme e aparece muito mais do que eu esperava e como sempre nos prende com seu magnetismo quando está na cena e a câmera focada nela.

Aquaman é um filme jocoso e tem gracejo, acerta a não se levar sério demais e ao, muitas vezes, abraçar a “galhofice” , deixando de lado a auto-importância enjoativa que maior parte dos filmes de herói trazem consigo.

A partir daqui conterá spoilers

Então, não seria eu falando sobre a DC se eu não deixasse minhas impressões de super fangirl e as coisas que mais me animaram.

  1. Aquaman em um cavalo marinho
Aquaman em cima de um cavalo marinho em “Superamigos” (1973–1985)

Sempre zoado em superamigos por montar cavalos marinhos e surfar em peixes. James Wan abraçou as cenas icônicas do Arthur em cavalos marinhos e adaptou para as telonas, mas com a diferença que a cena em questão me fez dá um sorrisinho da dívida histórica que todos que não levaram a sério o Arthur Curry pagaram a língua, pois a cena ficou épica.

2. Beijo do Arthur e da Mera igual a uma capa dos Novos 52 de Aquaman

Arthur e Mera na capa da HQ de “Aquaman” (Novos 52-vol 7)

Bem, talvez a maioria das pessoas não dê tanta importância a essa cena, mas eu amo quando alguém tem cuidado de agradar os fãs e sem dúvida a cena do beijo entre eles no meio de uma batalha entre reinos foi igual a capa da edição 48 dos novos 52 de Aquaman com direito a mesma posição de perna e as explosões atrás.

3. Os sete reinos

Cena de Guerra no reino de Brine -salmoura- em “Aquaman” (2018)

Achei muito legal que eles comentam a respeito dos 7 reinos que compõe os oceanos: Brine (salmoura), formado por uma raça de crustáceos; o Fosso, onde criaturas da parte abissal vivem; Xebel, os maiores aliados dos Atlantis e descendentes de humanos assim como eles (Mera e a família são de Xebel); Os fisherman (pescadores), raça de intelectuais que são parte peixe; os próprios Atlantis e o Reino desaparecido, que se encontra no núcleo da Terra. Em um dos cartazes, há uma frase do rei Orm que é “una os sete”, mas só entendi ao ver o filme, como Orm quer ser “mestre dos oceanos” ele precisa conquistar (ou se aliar) a outros reinos.

4. O KARATHEN (AAAAA)

O Karathen em Novos 52

Ok, esse foi o momento onde eu mais pirei, foi tipo “eu vivi para ver o Karathen nas telonas”. Toda esse meu entusiasmo se deu, pois quando eu comecei a ler mais DC (meados de 2008–2009), porque eu só lia Flash antes disso, eu percebi o quão Arthur Curry era injustiçado. Caramba, ele se comunicava com animais marinhos, controlava o Karathen (que é tipo um Kraken), é super forte e nada em uma velocidade absurda. Então toda vez que eu entrava numa discussão com alguém, eu ficava “ Mas você não controla um Kraken que nem o Aquaman” .

5. Arthur lutando contra criaturas do fosso

As criaturas do Fosso em Novos 52

Eu realmente não estava esperando que adaptassem os monstros do Fosso para o cinema. Então quando eu sentei naquela cadeira e assisti ao filme e percebi que uma das cenas mais lindas (fora aquelas que se passam na Atlântida luminosa) foi a do Fosso. Arthur e Mera iluminando o caminho na parte abissal e os monstros os perseguindo foi de arrepiar qualquer um que conheça os arcos que envolvem o reino do Fosso nas HQs.

6. Traje amarelo e verde

Cartaz do filme “Aquaman” (2018)

O que não era tão novidade assim, pois havia sido confirmado anteriormente que o Arthur usaria o traje clássico (verde e amarelo), mas vê-lo de perto no cinema são outros quinhentos, realmente uma explosão de emoções.

7. O anel de fogo

Arthur se preparando para uma luta no anel de fogo em “Liga da Justiça sem limites” (2001–2006)

Liga da Justiça sem limites foi um dos desenhos que mais marcaram minha infância e ao ver que eles colocaram uma cena envolvendo o “anel de fogo” (uma luta clássica entre os atlantis) me deixou muito feliz. Em um dos episódios da segunda temporada de L.J o “anel de fogo” aparece e uma luta entre Arthur e Orm acontece. O melhor de tudo é que no filme de Aquaman ainda colocaram os trajes de luta dos atlantis para o “anel de fogo”.

8. “Preciso de um capacete maior”

Cena do filme “Tubarão” (1975)

Pode ter sido impressão minha, mas eu tenho quase certeza que tenho razão e que a cena na qual o Arraia Negra está mexendo no capacete quando ele explode e ele diz “Vou precisar de um capacete maior” é uma referência ao filme de Spielberg “Tubarão” que o Jimmy fala “Vamos precisar de um barco maior”. O que me faz ter tanta certeza dessa ideia é que o James Wan é um cara influenciado por filmes de terror e suspense, ou seja, é a praia dele, e quando o Arraia Negra fala essa frase, me veio automaticamente “Tubarão” a mente.

9. O movimento hidrodinâmico dos Atlantis

Arthur e Mera se locomovendo pela água (Novos 52)

O jeito que os atlantis se movem pela água é muito próprio, o filme adaptou o nado turbo deles de maneira realística (dentro do universo fantasioso proposto). Foi claro que houve um estudo de como seria esse nado dos atlantis e como ficaria o mais palpável no cinema e como eu falei antes é muito reconfortante ver o cuidado aos detalhes.

10. Atlanna em seu traje de guerreira

Atlanna nos Novos 52

Eu achei muito que a participação da Nicole Kidman seria apenas no início da trama, como introdução a origem do personagem. Entretanto, quando ela aparece no Reino Desaparecido com a roupa de guerreira foi um boom na cabeça. Os cabelos cinzas , a roupa marrom, os detalhes da vestimenta, foi realmente muito legal de se ver.

11. Comunicação do Arthur com os animais

Cena do desenho “Superamigos” (1973–1985)

Outra referência a vanguarda do Aquaman é a comunicação dele com os animais marinhos. Ao fazer isso, umas ondas saiam da cabeça dele indicando a comunicação e isso foi adaptado para o cinema. Em muitos momentos víamos as ondas que o Arthur emitia para se comunicar com os animais.

12. Final inspirado na arte de Alex Ross

Arte de Alex Ross

Alex Ross é um dos maiores fãs de Aquaman e já fez muita arte para DC (vejam o reino do amanhã que ele faz uma releitura da Liga da Justiça inteira). A arte acima de Ross lembra muito o final do filme Aquaman (2018) na qual ele está em uma “pose de herói” com o por do sol e animais marinhos atrás antes de aparecer o nome ‘Aquaman’ no encerramento do filme.

13. Topo tocando tambor

Topo e Aquaman em uma HQ antiga de 1965

Esse easter egg passou que nem percebi, inclui nessa lista pois quando um amigo meu veio me perguntar “Você viu o Topo?” e eu fiquei “queee?”. Então o ponto vai para ele que me recordou que a cena da luta entre Orm e Arthur no anel de fogo aparece um polvo tocando um tambor e Topo era um polvo musical de Atlantis que era melhor amigo do Aquaman nas edições dos anos 60 das HQs.

14. Leigh Whannell, o Adam de Jogos Mortais como cameo no filme

Leigh Whannell em “Jogos Mortais” (2004)

Outro easter egg que me passou despercebido (obrigada a Lucas novamente por me fazer notar isso) foi o Leigh Whannell (o Adam de Jogos Mortais) esse ator aparece em um “cameo” no filme como o piloto de avião que leva Mera e Arthur para o deserto. Na verdade, eu acredito que eu nunca iria notar se meu amigo não falasse, pois eu não sou uma pessoa muito apegada a Jogos Mortais (terror gore me dá agonia), mas achei muito interessante a participação especial dele, já que ele junto a James Wan criaram o roteiro de Jogos Mortais (com Wan na direção também)

P.S: Eu vi uma boneca Anabelle na cena que Mera leva o Arthur para um bolsão de ar em Atlântida para falar com Vulko. Mas eu não achei nada confirmando ou negando que realmente era uma Anabelle junto de outras quinquilharias que tava na cena. Se alguém souber alguma confirmação ou tiver mais alguma referência que eu perdi é só me avisar.

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Maysa Costa

Amante de filmes, desenhos, livros, séries, HQ’s e cultura pop em geral