A esposa é um exercício de observação proporcionado pela Glenn Close.

Maysa Costa
4 min readJan 24, 2019

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Sem spoilers

Cena do filme “A esposa” (2018)

Baseado no livro “The wife” de Meg Wolitzer, “A esposa” se passa no começo dos anos 90 e acompanha o casal Castleman que viaja para Estocolmo para que John receba o prêmio Nobel de literatura, o que leva a esposa dele (Joan) fazer uma reflexão sobre as decisões da sua vida. A direção é do sueco Björn Runge e ele sabe mostrar bem a personalidade dos protagonistas, logo de cara a cena de abertura nos proporciona um momento de intimidade entre eles que nos convence que eles estão há mais anos juntos.

Cena do filme “A esposa” (2018)

O design de produção capricha em ambientes internos simétricos que são favorecidos pelos planos aéreos escolhidos pelo diretor. Os usos de câmera na mão favorecem o ar tempestuoso de certas cenas mais dramáticas, já não há muito de comentar da fotografia, ela não é inventiva, mas valoriza os ambientes fechados nas quais os personagens estão.

Os flashbacks são o ponto baixo do filme, pois além de quebrar o ritmo, perde toda a sutileza das atuações dos atores que fazem os personagens no presente, principalmente em uma cena que a Joan mais nova verbaliza uma informação para o bebê, ficou brega, expositivo e estereotipado. Já os pontos altos são as cenas de protocolo, quero dizer, apresentações rasas, elogios vazios e a chuva de etiquetas que funcionam para trabalhar emoções que são imprescindíveis para o desenvolvimento da narrativa e é aí que os atores brilham.

Glenn Close e Jonathan Pryce como John e Joan Castleman em “A esposa” (2018)

Não há dúvidas que o ápice do filme são as atuações. Glenn Close, a Joan, nos presenteia com reações misteriosas, diálogos passivo-agressivos e muito deboche. A personagem dela tem uma formalidade elegante que aparenta ser um mecanismo de defesa constante e as reações da Joan faz ser necessário assistir o filme mais de uma vez. O momento é da Glenn, ela eleva o filme, a personagem passa a maior parte do filme cuidando do marido, pois ele é o gênio que recebe as honrarias, mas as expressões dela nos faz levantar suspeitas que há algo de errado acontecendo.

Max Irons e Glenn Close como David e Joan Castleman em “A esposa” (2018)

Jonathan Pryce faz um personagem egocêntrico e narcisista, é uma dificuldade de gostar dele em alguns momentos e isso é grande mérito do ator por nos mostrar um cara que sem dúvidas ama a família, mas acredita tanto que tudo deve girar em torno dele que estraga certas relações. Max Irons é o filho dos Castleman e transmite bem o peso que é crescer com uma constante necessidade de aprovação. Dá para notar a relação dele muito mais confortável com a mãe e temeroso com o pai por não se achar a altura de sua genialidade.

Glenn Close e Christian Slater como Joan Castleman e Nathaniel Bone em “A esposa” (2018)

Christian Slater está no filme para falar coisas expositivas, não é uma atuação ruim, mas foi usado como uma convenção narrativa. A entrada e a saída dele parece muito artificial quase como telegrafada e fica um pouco destoante da história, entretanto ele é bastante operante como “o escritor que quer escrever uma biografia não autorizada sobre seu ídolo”.

Cena do filme “A esposa” (2018)

O roteiro apesar de apresentar alguns deslizes -como os flashbacks- ele acerta em momentos que fazem intrigar os espectadores, uma vez que certas informações são reveladas se faz um exercício de regressão das cenas anteriores para analisar as reações dos personagens a respeito das situações e ligar os pontos para entender o que está acontecendo. “A esposa” é um filme problemático na estrutura, mas que traz uma reflexão sobre machismo e opressão e faz o espectador exercitar seu poder de observação por causa das inúmeras reações misteriosas da Glenn Close.

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Maysa Costa

Amante de filmes, desenhos, livros, séries, HQ’s e cultura pop em geral